terça-feira, 26 de julho de 2011

David Hume e a arrecadação de recursos para o Terceiro Setor

O filósofo inglês David Hume dizia que, em última instância, todo o conhecimento é derivado de uma lógica circular. Ou seja, em última instância, não podemos fundamentar em uma lógica externa qualquer conhecimento. Isto porque todo o nosso conhecimento é baseado na pressuposição de que as coisas tendem a se comportar como elas se comportaram no passado.



Assim, sei que uma maçã, se jogada para cima e sem ninguém para pegá-la, vai cair apenas porque todas as vezes (no passado) que uma maçã foi jogada para cima ela caiu – a lei da gravidade foi postulada a partir dessa simples observação. Isto quer dizer, simplesmente, que usamos o passado para prever o futuro.
Mas quem disse que podemos usar o passado para prever o futuro? O único expediente a que podemos recorrer é que, no passado, recorrer ao passado para prever o futuro funcionou. Por isso a lógica é circular: usamos o mesmo argumento (no passado foi assim) para comprovar a hipótese (se no passado foi assim, no futuro será da mesma forma).
No entanto, esse primeiro pulo da fé é essencial para qualquer construção de conhecimento. Todo o conhecimento, pelo menos para o filósofo inglês, deve ser pautado nessa pequena hipótese: o futuro tende a repetir o passado.

Essa idéia fica bastante evidente depois de explicada. Na verdade, mesmo antes de saber disso, recorremos a essa forma de pensar para construirmos nossas idéias. Estamos sempre pensando no passado para construir nossas hipóteses para o futuro.

Entretanto, quando sabemos que esse é o expediente do conhecimento, e atuamos em cima desse expediente para a construção de nossas idéias, temos uma grande vantagem. Em particular, no ramo da mobilização de recursos essa vantagem é interessante.

Ora, tendo esse conceito extraído de Hume em mente, precisamos fazer a seguinte pergunta (para os nossos possíveis colaboradores): o fato de uma empresa/pessoa ter ajudado um tipo de causa no passado aumenta ou diminui a probabilidade de ele ajudar agora?

Se seguíssemos a proposição de Hume de maneira cega, diríamos que o histórico de doação de uma empresa ou pessoa aumenta a probabilidade de doação futura dessa pessoa. Bom, no fundo, tal conclusão não está completamente errada, mas precisamos atentar a alguns detalhes. Em primeiro lugar: é preciso entender que existe um ponto de saturação. Ou seja, a partir de um limite, a empresa não pode (ou quer) mais doar. E isso é verdade tanto para a Petrobrás quanto para a padaria da esquina .

Esse limite, geralmente, deve ter relação com o limite de incentivos fiscais a que uma empresa pode recorrer. Isto é, a partir do momento em que os abatimentos de impostos deixam de existir, a probabilidade de a doação acontecer passa a diminuir drasticamente. Mas é importante deixar claro que, longe desse limite, alguma empresa (ou pessoa) que tem o costume de incentivar projetos em uma determinada área, será mais facilmente convencida a investir em um novo projeto dessa área.

Pelo outro lado, empresas/pessoas que não tem o hábito de doar serão mais difíceis. Isso não significa que não devemos ir atrás delas; pelo contrário, conseguir “converter” essas empresas/pessoas é fundamental. Afinal, precisamos renovar e aumentar as fontes de financiamento para o terceiro setor. Entretanto, é importante ter claro que a estratégia de venda do projeto, nesses casos, é um pouco diferente. Mais do que diferente, é mais complexa. No mínimo por que deve ser adicionado um passo importante na venda: o “por que doar” em geral (e não apenas por que doar para essa causa). Esse passo deve contemplar, além dos aspectos emocionais ligados a causa, todos os aspectos racionais ligados aos benefícios dados àqueles que doam. Ou seja, um plano elaborado de explicação das leis de incentivo fiscal, e uma idéia bem concebida de patrocínio e benefícios devem receber uma atenção redobrada.

Seja como for, tanto para uma empresa acostumada a dar incentivos quanto para uma nova no ramo, o que vendemos é uma parceria. O que significa que o dinheiro doado tem uma contrapartida – cultural, social ou ligada ao esporte. Por isso é importante que o contato com a empresa não seja apenas nos momentos de pedido de dinheiro. O contato deve ser constante, e acontecer tanto para manter a empresa a par do trabalho que o dinheiro dela está gerando, quanto para manter as redes de relações entre a empresa e a instituição abertas. Não queremos ser obrigados a lembrar a empresa doadora quem somos na hora de pedir o dinheiro: o financiamento deve ser a conseqüência natural e clara de um relacionamento mais profundo, o qual pressupõe custos e benefícios para os dois lados.  

Como último comentário, para saber quem tem o costume e quem não tem, é recomendável a visita a sites do governo (como a portaria do esporte) que dão um plano detalhado de cada um dos projetos aprovados e dos respectivos patrocinadores.

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